quarta-feira, 5 de fevereiro de 2020

Por Onde Andei


O Existencialismo e a Utilidade Social

A vida humana só tem sentido racional quando quando a pessoa dá uma utilidade social para a sua existência. Não se trata de nenhuma caridade religiosa. Voltaire sugeriu que se deva dar como resposta à efemeridade da vida humana e aos imprevistos da existência, o prazer pessoal. Isso não justifica o ato existencial. Visto que, desde o nascimento, e sempre, somos recepcionados por uma sociedade familiar, devemos recepcionar o outro e colocar a nossa utilidade social na interpessoalidade. Um bom sapateiro tem utilidade social. Alguém, em algum lugar, precisa dos seus serviços. Junto com a noção de utilidade do talento de cada um para o bem de todos, que é o que caracteriza a vida social, nasceu a Educação como argumento dessa percepção (do melhor para todos) que deveria ser transmitida de geração para geração. O objetivo da Educação é preparar a pessoa para ser útil socialmente e promover o desenvolvimento da utilidade em todas as áreas do conhecimento histórico adquirido e em todos os setores da vida social. O primeiro conteúdo da escola primitiva foi este: A ideia da utilidade de cada um para o bem de todos, portanto uma disciplina social. Por quê? Porque através da união e da cooperação no mesmo objetivo toda a comunidade estava mais protegida e melhor aparelhada para enfrentar os perigos da natureza e das outras comunidades. As organizações sociais, e até mesmo os governos e o Estado, nasceram e foram inspirados por essa noção de utilidade da vida pessoal em função da coletividade. Por isso, e com razão, o professor Dermeval Saviani disse que a Educação remonta aos primeiros grupos humanos. Ele argumentou, 
durante uma palestra no Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Paraná - APP-Sindicato, referente ao VI Congresso da entidade, realizada em 26/10/1995, que "no momento em que o homem surgiu no universo surgiu também a Educação" não formal como uma escola de ensino-aprendizagem dos valores compreendidos como utilidade social, cujos valores são aprendidos em qualquer família: honrar pai e mãe, respeitar os irmãos, colaborar no gerenciamento da casa, defender-se mutuamente, etc., pois, necessariamente, agora o homem, tendo saído do estado de natureza, era entendido como humano e não mais como animal. Foi criada uma ética primitiva que comprometia toda a comunidade a obedecer certas regras. Então nasceu a questão da utilidade social do indivíduo em sociedade. No estado de natureza anterior, o homem só precisava ser útil a si mesmo e deveria fazer de tudo, inclusive maltratar o semelhante, para alcançar seus objetivos e saciar seus prazeres. A pessoa fora do estado de natureza só se justifica socialmente quando sua vida está voltada para o outro, não no sentido religioso de caridade, mas de buscar o bem de todos antes de pensar em satisfazer-se preferencialmente. É preciso ser ético no sentido de ser útil ao semelhante e ao meio social, e nenhuma profissão está tão próxima desse sentido quanto a do professor. Sem dúvida, a noção mais primitiva de viver em sociedade nasceu da percepção da vantagem da utilidade de cada um para o conforto e a segurança de todos. Cabe aqui ressaltar que a caridade justifica a injustiça social e não produz nenhuma utilidade definitiva, e isso nada tem a ver com o assunto da utilidade social do indivíduo. Qualquer um de nós pode optar pela vida animal e sair por aí mordendo os outros, mas isso não vai convencer toda a sociedade a fazer o mesmo, e, neste caso, o nosso destino será inverso ao que foi escolhido no começo dos tempos, pois a sociedade moderna se deu conta de que o indivíduo só existe realmente quando alguém procura a sua utilidade ou prestação de serviço. Nós vivemos para os outros e não para nós mesmos. Uma pessoa que vivesse isolada numa ilha deserta seria o mesmo que não existir, ninguém teria notícia da sua existência. Viver para si mesmo num ambiente de sociedade colaborativa é uma decepção. A felicidade real só existe quando a pessoa disponibilizou publicamente suas habilidades e talentos para se integrar socialmente. Quando alguém me procura por causa da minha utilidade, é aí que eu provo ou me conscientizo de que existo. Como ente social, a consciência de fazer algo para o outro é muito mais forte ou evoluída do que o desejo de fazer algo para si mesmo. Observemos que o trabalho constitui a forma mais direta de conexão (interpessoalidade) com o semelhante, e o existencialismo da utilidade, aplicado à educação, sugere que o melhor desempenho da pedagogia da aprendizagem está na preparação do educando desde a educação infantil para o trabalho em grupo, para a integração social e para a formação da consciência de si mesmo como um ente de utilidade comunitária. Não se trata de dizer que a pessoa vive para servir, porque tal ideia é repugnante, remonta a todo tipo de escravidão e suscita hierarquização despótica. A ideia é que o cidadão colabore com o seu talento pragmático para o bem da sociedade, viva disso e tenha racionalmente sua existência justificada através de uma consciência interpessoal construída em cima da noção de benefício coletivo das ações pessoais. A Educação, voltada para o ensino da utilidade social, talvez seja a a ação pedagógica mais acertada para desviar os grupos humanos da antropofagia político-social onde cada vez mais os grupos econômicos e culturais tentam se perpetuar derrotando os interesses legítimos dos outros grupos. A menor distância entre o povo e o desenvolvimento das relações sociais ainda é a Educação.










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